Uma prima minha conta que certa vez houve um acidente terrível na avenida em
frente ao edifício em que ela mora: dois carros haviam batido violentamente. Em
um dos carros estava uma garotinha que morava no prédio desta minha prima. Ela
conhecia a garota de vê-la quase que diariamente, conhecia também os pais assim
de passagem pelas áreas comuns do prédio.
Bom, a garotinha ficou muito ferida no acidente e foi hospitalizada em estado
muito grave. Alguns dias depois minha prima soube que os pais dela haviam mudado
do prédio e ao perguntar ao porteiro se ele tivera notícias da criança obteve
uma resposta um pouco vaga. Enfim, ao que parecia a garotinha havia melhorado.
Certa vez, ao esperar o elevador social para ir ao trabalho ela começou a ouvir
uma risada de criança que cada vez mais ficava mais próxima e então percebeu que
vinha do elevador de serviço que se aproximava do andar em que ela estava, então
ela correu até ele para ver se dava tempo de pará-lo e pegá-lo, pois estava com
um pouco de pressa. O elevador estivera por alguns dias parado para manutenção
por isso ela, que ia para a garagem onde o elevador social não chegava, estava
esperando por ele mesmo.
Na hora ela ficou surpresa em ver o elevador de serviço funcionando. Ela correu
e não conseguiu pegar o elevador, mas pôde ver claramente pela janelinha da
porta do elevador que lá dentro, enquanto a cabine passava pelo andar dela,
estava a garotinha acidentada que olhou para ela e começou a gargalhar.
Minha prima ficou radiante pois ela havia ficado muito comovida com o acidente e
o jovem casal de pais da garotinha ao qual ela não teve acesso após o acidente
mas imaginava como deviam estar, enfim, ela chegou a comentar no trabalho, pois
também havia comentado o acidente. As pessoas também demonstravam um alívio ao
serem informados que a garotinha estava bem.
Na manhã seguinte ela aguardava o elevador de serviço para ir ao trabalho, mas
ele demorava muito. Ela ficou muito chateada julgando que alguém estava
prendendo o elevador em outro andar. Deu uns tapinhas na porta e chegou até a
assoviar dentro do fosso para ver se o provável prendedor soltava o elevador
para ela. Ela esperou e desistiu, foi de social, mas na passagem para a garagem
aproveitou e reclamou com o porteiro para que ele fosse verificar quem estava
prendendo o elevador de serviço.
Ele ficou confuso e surpreso e levou ela até o elevador de serviço e chegando lá
ela, completamente pasma, viu o elevador com a placa de reparo. Antes que ela
perguntasse se ele havia quebrado de novo o porteiro já foi logo falando que a
peça a ser trocada ainda não havia chegado e que por isso o elevador estava
entrando no sétimo dia sem funcionar. Minha prima disse que a impressão dela foi
parar no pé na mesma hora e ela teve uma pequena vertigem e não conseguia falar,
gaguejava. Teve uma crise de choro instantânea e subiu para a recepção do
prédio. Lá o porteiro lhe deu um pouco d'água com açúcar. Ela lembrou que na
véspera estacionara o carro e chegou a ver a placa no elevador e pensou: quebrou
de novo e subiu no social, mas provavelmente por estar muito cansada apagou isso
totalmente da cabeça e naquela manhã não lembrava disso.
Ela não conseguiu ir trabalhar e passou aquele dia inteiro com uma dor de cabeça
muito forte. E só chorava, passou o dia chorando sem parar enquanto lembrava de
tudo.
Muitos dias depois, após procurar muito, ela obteve notícias da garotinha. Ela
não resistiu aos ferimentos e faleceu na madrugada seguinte ao acidente.
Como explicar?
Nelito Reis